terça-feira, 30 de abril de 2024

O Sagitário que tinha medo de Amar



Já me habituei a ocupar toda a cama quando vou dormir, a abrir as pernas sem sentir ninguém do meu lado, a acordar por mim sem que alguém me peça algo que já não me apetece dar a meio da noite, a levantar-me e tomar banho sozinho e durante o tempo que quiser, a preparar o meu pequeno almoço com a toalha húmida enrolado na cintura, a cantar em voz alta sem que me mandem calar porque lhes dói a cabeça, sem que me digam que não passo de um egoísta, sem que me virem as costas cuspindo palavras de desprezo. Já me habituei a não ter de dar explicações a nenhum ser vivo e a escolher fazer o que gosto sem ter de pedir autorização a alma nenhuma, a cancelar encontros quase em cima da hora simplesmente porque me tornei dono do meu tempo e da minha vontade, a demorar-me onde quiser e a ir embora assim que me apetece dos lugares que me entediam ou não me dizem nada. Já me habituei às minhas coisas, a mim e à minha vida, ao meu silêncio e ao som da minha música, à cova no meu sofá e às migalhas de bolacha sobre a camisola, a ficar na minha companhia sem ter medo de estar só nem precisar da companhia de ninguém, a sentir e compreender que isso não é solidão, mas é tão-somente a alegria de poder ser feliz comigo mesmo sem precisar da presença de seja quem for. Há coisas que se aprende tarde, mas mesmo assim muito a tempo de vivê-las sem remorsos. Sem esquecimentos forçados. Sem quase nada, pois na verdade passaram a ser quase tudo.

texto retirado meu novo livro "O Sagitário que tinha medo de Amar"
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Faxina

 



“Estava precisando fazer uma faxina em mim... 

Jogar fora alguns pensamentos indesejados,

tirar o pó de uns sonhos,

lavar alguns desejos que estavam enferrujando...

Tirei do fundo das gavetas lembranças que não uso e não quero mais.

Joguei fora ilusões, papéis de presente que nunca usei, sorrisos que nunca darei...

Joguei fora a raiva e o rancor nas flores murchas guardadas num livro que não li.

Peguei meus sorrisos futuros e alegrias pretendidas e as coloquei num cantinho, bem arrumadinhas.

 Fiquei sem paciência!

Tirei tudo de dentro do armário e fui jogando no chão: paixões escondidas, desejos reprimidos, palavras horríveis que nunca queria ter dito, mágoas de uma amiga sem gratidão, lembranças de um dia triste...

Mas lá havia outras coisas... belas!!!

Uma lua cor de prata... os abraços... aquela gargalhada no cinema, o primeiro beijo... o pôr do sol... uma noite de amor. 

Encantada e me distraindo, fiquei olhando aquelas lembranças.

Sentei no chão, joguei direto no saco de lixo os restos de um amor que me magoou.

Peguei as palavras de raiva e de dor que estavam na prateleira de cima - pois quase não as uso - e também joguei fora!

Outras coisas que ainda me magoam, coloquei num canto para depois ver o que fazer, se as esqueço ou se vão pro lixo. 

Revirei aquela gaveta onde se guarda tudo de importante: amor, alegria, sorrisos, fé… 

Como foi bom!!! 

Recolhi com carinho o amor encontrado, dobrei direitinho os desejos, perfumei na esperança, passei um paninho nas minhas metas e deixei-as à mostra.

Coloquei nas gavetas de baixo lembranças da infância; em cima, as de minha juventude, e... pendurado bem à minha frente, coloquei a minha capacidade de amar... e de recomeçar...”


________Martha Medeiros